A tokenização, a tecnologia que promete transformar qualquer ativo – de imóveis a obras de arte – em unidades digitais negociáveis, está em um ponto de inflexão. O motor tecnológico está pronto, aquecido e capaz de operar maravilhas. No entanto, para que essa inovação saia da promessa e se torne uma força dominante no mercado financeiro, ela precisa de um combustível essencial: a liquidez massiva que hoje repousa nas mãos dos investidores institucionais.
O debate, que ganhou destaque durante a Digital Assets Conference (DAC 2025), é claro: a tecnologia por si só não basta. É como ter uma rodovia de alta velocidade perfeitamente construída, mas sem carros para trafegar. “Como ferramenta, a tecnologia é poderosa. Mas quem vai trazer liquidez é o investidor tradicional, que precisa de processos bem construídos”, afirmou um dos especialistas no evento.
Essa afirmação resume o principal desafio do setor. O investidor institucional, acostumado com ambientes regulados e processos robustos, ainda olha com cautela para o universo dos ativos digitais. Para atrair esse “dinheiro antigo” e experiente, o ecossistema de tokenização precisa amadurecer em frentes cruciais.
O Dilema Regulatório: O Ovo e a Galinha
Um dos maiores entraves atuais é a regulação. O cenário, especialmente no que tange ao crowdfunding e às negociações em mercados secundários, ainda é nebuloso e restritivo. Isso cria um paradoxo: a regulação avança para atender a uma demanda existente ou a demanda só surgirá quando houver um ambiente regulatório claro e seguro?
Essa incerteza, somada à falta de interoperabilidade – a capacidade de diferentes plataformas de tokenização “conversarem” entre si –, fragmenta a liquidez. Cada plataforma opera como uma ilha, com seu próprio pequeno volume de negociações. A solução, segundo especialistas, é criar pontes entre essas ilhas. “Quando for possível conectar esses pools, teremos um mercado secundário mais pujante”, aponta um dos painelistas.
Construindo a Confiança do Mercado Tradicional
Para o fundador da gestora de venture capital Honey Island, Marcelo Epstein, a chave está em oferecer produtos de alta qualidade e com uma estrutura impecável. “Um produto bem estruturado atrai o investidor. O institucional quer um processo bem azeitado”, explica.
Isso significa que, além da tecnologia blockchain, as ofertas de tokens precisam vir acompanhadas de governança clara, segurança jurídica e processos de custódia e auditoria que espelhem a solidez do mercado financeiro tradicional. Apenas com essa roupagem de seriedade e confiança será possível furar a bolha da Faria Lima e atrair o capital que realmente pode escalar esse mercado.
A tokenização tem o potencial de democratizar o acesso a investimentos e injetar agilidade em mercados historicamente ilíquidos. A tecnologia já provou seu valor. Agora, o desafio é construir uma ponte sólida e confiável para que o capital institucional possa cruzá-la, transformando uma promessa revolucionária em uma realidade de trilhões de dólares.